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sexta-feira, fevereiro 13, 2015

Colorado, Montanhas Rochosas e Red Rocks

Olha aqui. Vou ser bem sincera. Tento entender as Montanhas Rochosas não é de hoje. É uma cadeia escorregadia que já foi vista por mim na British Columbia, Canadá, e no Novo México, EUA.
Ela é linda e deslumbrante e está majestosa no Colorado formando aquele paredão genial, do mesmo jeito como é visto em Vancouver.



Foto tirada com muito favor quando o guia deu uma paradinha em cima de um viaduto e, voilà, as Montanhas Rochosas bem ao fundo!
As Red Rocks são formações rochosas que deram nome ao rio e ao estado do Colorado. Os brasileiros espertos sabem que "red" quer dizer vermelho em inglês e "colorado" em espanhol.
Aliás, olha aqui, eu nem ia falar sobre isso, mas o que o Reino da Espanha andou aprontando por aqui só não está muito claro pra maioria dos norte-americanos, não por nada, apenas porque é assim que é. Montana, Colorado, California, Nevada, Arizona, Novo México, Texas, Flórida, tá bom pra vocês? Tudo colonização espanhola, me deixem.
Às vezes esqueço que o maior país de colonização espanhola, o México, está aqui na América do Norte! 
Às vezes esqueço que quem descobriu a América não foram os americanos! Não foram os ingleses, nem os franceses, nem os holandeses, e os portugueses muito menos! Isso! Foram os espanhóis, não assim tão claramente, pois Colombo talvez fosse italiano, mas quem deu "as ordi" foram os reis da Espanha, ué, convivamos com isso!
A galera que veio no Mayflower e se instalou no nordeste americano pode se considerar os verdadeiros colonizadores da América, até porque espanhóis e franceses são os típicos conquistadores - não gostam de ficar e criar família, essa é que é a verdade. Digo isso enquanto conquistadores de territórios, e reconheço que se trata de uma meia-verdade porque boa parte do continente americano é até hoje espanhola. Não sei por que cargas d´água o Brasil escapou dessa, foi tristemente rejeitado pelos franceses e holandeses e, enfim, viva os portugueses!, nada de ingratidões numa hora dessas. Deus sabe que tem um propósito pra esse Brasil e sua língua portuguesa exclusiva no continente americano. Mas só Deus sabe, somente Ele.
Voltando às Red Rocks: são bem bonitas pessoalmente e vocês já sabem como os americanos operam, né? Otimizam tudo, deixam tudo um brinco, de modo que nesse conjunto de rochas que, encabuladamente informo a vocês, tem cerca de 300 (trezentos) milhões (milhões!!!) de anos - fico sinceramente encabulada por não conseguir compreender o que sejam milhões de anos diante de mim, em monumentos e elementos que posso ver e desfrutar. É uma forma bem tosca de disfarçar a pobreza de nossos 80 ou 100 anos de duração nessa terra, só pode.
Nessas Red Rocks construíram um anfiteatro onde os Beatles tocaram em 1964, entre outros, entre outros. Vou te contar, hein?
Nesse anfiteatro os fitness irritantemente sobem e descem as escadarias quando não tem show, bem, show tem, né? Assim eles pensam.
Concluindo esse papo e já introduzindo um próximo post, como é complicado entender a presença dos ameríndios, esses que, coitados, já de saco cheio de tanto frio, desceram do polo norte, isso mesmo, os esquimós, e criaram e desenvolveram culturas tão magníficas no continente americano! Andando por essas estradas sempre vejo placas "Você está entrando [ou saindo] do território dos índios... tais e tais e tais" (Apaches, Sioux, Navarros, Cherokees). Fico sem muita vontade de entrar nessas reservas com medo de encontrar aquelas inomináveis quinquilharias "made in China". Não dá, não dá. Só digo que a situação dos índios americanos não parece ser nada melhor que a dos índios brasileiros, dos índios sul-americanos, dos índios em geral, dos índios.






Denver: 300 dias de sol por ano

A primeira coisa que a gente pensa quando vai viajar para o Colorado no inverno é que vai enfrentar temperaturas muito baixas e toneladas de neve, que engano! Na verdade, o Colorado nem é o estado mais ao norte dos EUA, acima dele estão o Wyoming e Montana. E, incrível!, abaixo dele o desértico Novo México e abaixo dele, o México.
Ficamos com essa idéia por causa das estações de esqui em Aspen, Vail - sem falar na charmosíssima Breckenridge, que é uma cidadezinha histórica bem bonitinha.
O que eu não sabia é que: o Colorado pertencia inicialmente ao estado de Kansas e que sua base de terreno é o deserto. Não admira que morri de tédio dirigindo direto e reto na I-70W (ida) e I-76 e I-80 E (na volta). Já no limite entre Kansas e Colorado comecei a notar que a altitude só aumentava. Quando cheguei em Denver a Gepeéssa marcava 1.600m em contraste com os 300m que temos aqui em Kansas City, MO.
Fico feliz em saber que Denver é uma cidade boa pra morar devido à essa estabilidade do clima, à segurança e ao custo de vida baixo em relação a outras capitais - especialmente as capitais costeiras. Digo isso porque por mais que eu tenha quebrado a minha cabeça pra entender a cidade, pra sentir a cidade, pra definí-la, não consegui. E, não. Não moraria em Denver, pelo menos à primeira vista. Fiquei com a sensação de que Denver pode se apresentar feíssima, como o faz na chegada e na saída por causa dos muitos viadutos de aspecto sujo, como pode se mostrar uma cidade compacta, diferente de Kansas City, por exemplo, onde notoriamente a cidade se divide em downtown, norte, sul, leste e oeste. Me pareceu, durante o city tour, que Denver é mais compacta, mas pode ter sido apenas uma impressão, já que na saída vi ao longe um enorme conglomerado urbano. Bem. A área metropolitana de Denver, disse-nos o guia, é de 2 milhões de pessoas. Você anda por lá e está sempre a um passo de cair de um county pra outro. É como  você em Araruama estar a dois passos de Saquarema, mais ou menos assim. Enfim, o city tour pela cidade me mostrou repetidamente, eis que nosso guia andou em círculos, que Denver tem uma parte bem compacta, com Jardim Botânico, Zoológico, Capitol, bairros chiques e bairros revitalizados, praticamente vizinhos uns dos outros.
É bacana ver aqui nos EUA o enfrentamento da situação urbana mais caótica e/ou menos privilegiada. Os cabras fazem logo uma revitalização, constróem um ou mais parques, enfim, abrem um leque de opções para o cidadão.
O transporte em Denver é muito peculiar: não tem metrô, tem pouquíssimas linhas de ônibus, um monotrilho que só serve ao centro da cidade, mas o que tem de ciclovias não está no gibi! Denver tem a maior malha de ciclovias interligadas do país! Vi com meus próprios olhos o quanto essas ciclovias são inteligentes e descoladas das ruas movimentadas e "perigosas". O rio Cherry Creek (considerado aqui um regato)  corta a parte mais central de Denver, e é ladeado em ambas as margens por ciclovias seguras e ecológicas. 
Conotação cinematográfica: na região de Denver Charles Deaton construiu a sua "Sculpture House", que serviu de locação para "O Dorminhoco", filme de Woody Allen.
Também em Denver foi filmado "O Iluminado", com Jack Nicholson.
Por incrível que pareça, não vi nem um nem outro. Pior: não fiquei a fim de ver.
 Essa foto do Capitólio de Denver só foi possível pq botei o sol atrás do poste de luz.
Casa Esculpida, cenário do filme "O Dorminhoco"

quarta-feira, fevereiro 04, 2015

Trinca De Reis Em Memphis

Em 1925 nasce o primeiro King, B.B.King, considerado o sexto maior guitarrista de todos os tempos pela revista Rolling Stone.
Em 1929 nasce o segundo King, Martin Luther King Jr., Pastor protestante e ativista dos direitos civis nos EUA.
Em 1935 nasce o terceiro King, este sem king no nome ou na alcunha, porém de fato e de direito o maior rei da cultura pop mundial. Elvis Aaron Presley, tão pobre quanto B.B.King e do mesmo Estado do Tennessee. Como seu colega músico, nasceu numa cidadezinha pequena e se mudou para Memphis, a Meca da música naqueles tempos.
O primeiro ainda está vivo e completou 88 anos em 16 de setembro passado.
Os outros dois Kings morreram jovens, muito jovens.
Os reis da música saem de suas pequenas cidades do Tennessee e vão para Memphis onde a glória e a fortuna os esperam. Essa cidade de Memphis fica na confluência de 3 estados americanos (Tennessee, Mississipi e Arkansas),  banhados e cortejados pelo rio Mississipi, sendo ele próprio uma lenda, uma entidade viva na cultura americana. É tão bonito de se ver no mapa, desde sua nascente no Lago Itasca em Minnesota até o seu delta no golfo do México. É, ele mesmo, um notável rio de inspiração musical e literária. Confiram.
Estando Memphis às margens do Mississipi é natural que tenha capturado todo o espírito cultural americano, oras, é um rio que corre de norte a sul, atravessa 10 estados americanos, grande parte deles são os mais afetados pela mistura étnica, melhor dizendo, pela influência dos negros, da pobreza, e da falta de glamour. É aí que mora o perigo. Ninguém fez boa música esquiando em Vermont, não que eu saiba.
Elvis cantou seus males nos tristíssimos negro spirituals na Assembléia de Deus de Tupelo, onde nasceu, e ganhou seu primeiro concurso aos 10 anos de idade, num show de talentos na "Feira Mississipi-Alabama". Nesse dia ele cantou a música "Old Shep", que fala do desespero de um menino que perdeu seu cão. Um menino da Nova Inglaterra poderia fazer isso, mas ele teria que ser o atípico menino da Nova Inglaterra, sem pais ricos, sem esquiar e sem uma segunda casa em Hamptons.
Não faço apologia à pobreza, a vida é que faz apologia às dificuldades. No pain, no gain, já ouviram essa, não é?
B.B.King não foi menos afortunado que Elvis: Começou ganhando uns trocados cantando numa esquina qualquer.
Elvis foi adepto do exagero, até porque tinha uma extensão vocal privilegiada, e não apenas isso, tinha mau-gosto mesmo, e se vestia quase que como uma drag queen, porém, isso em nada afetou o seu talento, ao contrário. Não fosse o seu topete, seus lábios carnudos, seus movimentos de quadril insinuantes, não fosse a imensa fortuna que fez de um dia para o outro, seus muitos carros e motos, seus dois aviões que não eram pequenos, sua mansão em Graceland, não fosse o galã, o bonitão, não fosse ele um ser humano inconfundível, um exagerado, não fosse ele ter ido pra guerra e ter encontrado na Alemanha o amor de sua vida, não fossem seus filmes água-com-açúcar, não fossem esses lances espetaculares em sua trajetória, talvez o mito não tivesse se construído de forma tão marcante na vida das pessoas, não importa quantas gerações passem. De alguma forma que não sei explicar, Elvis não morreu.
Em 14 de outubro de 1964 Martin Luther King recebeu o Prêmio Nobel da Paz, o que trouxe honra para ele e seus liderados, e uma tremenda dor de cabeça para Lyndon Johnson, enxaqueca essa que o FBI resolveu de forma muito eficaz no dia 4 de abril de 1968, quando ele tinha apenas 39 anos, mulher e 4 filhos menores.
Vamos arrumar essa trinca de reis: Luther King se foi deste mundo com 39 anos de idade. Presley, com 42 e B.B.King, que não se meteu com nada que não fosse a sua adorada Lucille, está vivo até hoje, cheio de prêmios e muito mimado pela Gibson Guitar Co.
A trinca de reis, de uma forma ou de outra teve seu destino ligado à cidade de Memphis. Elvis morreu de overdose medicamentosa, Luther King foi assassinado e, a bem da verdade, não estou bem certa se B.B.King vive atualmente na cidade. Parece que sim.
A unir Elvis e B.B.King encontramos John Lennon, dizendo sobre Elvis: "Before Elvis was nothing" e sobre B.B.King: "... minha maior ambição é tocar guitarra como B.B.King".
A riqueza musical e artística que havia em Elvis não cabia nele, enquanto que a mesma riqueza cabia em B.B.King tão bem cabida que ele consegue ser minimalista no excesso. Segundo suas palavras, "posso fazer uma nota valer por mil".
Que bacana que há espaço para todos os estilos e todas as formas de expressão artística! E que a riqueza pode ser exuberante tanto quanto pode ser contida.
Luther King encontrou seu destino final longe de casa. Estava se preparando para uma de suas marchas em Memphis quando foi assassinado num motelzinho chulé em downtown.
Uma trinca de reis que se consagrou numa tríplice fronteira, às margens do lendário Mississipi. Dois deles encontraram a morte cedo demais e o remanescente dos três continua por aqui, para contar esta e muitas outras histórias.



Esses 2 carros continuam em frente ao quarto 306 do Motel Lorraine, onde Luther King se hospedou na véspera de ser assassinado.

sábado, janeiro 31, 2015

Selma

Eu e minha companheira de viagem concluímos que não existem muitas cidades com nome de mulher. Vamos nos conformar com a configuração machista do mundo, entendendo que há contrapartidas que favorecem muito as mulheres, e que, infelizmente e naturalmente, são quase incógnitas tanto para homens quanto para mulheres.
Vou dar apenas um exemplo: vocês sabiam que geneticamente todos os embriões são femininos até a 6a. semana de gestação? Ou seja, originariamente, embrionariamente, a menina não sofreu nenhuma mutação da concepção ao nascimento. Suas gônadas permanecem as mesmas, da 1a. semana até à última. Já o menino, que vinha desde o início com o par de cromossomos X, repentinamente perde um X e ganha um Y. Não é à-tôa que com esse duplo X as mulheres sejam tão indesvendáveis e os homens com esse Y sejam tão previsíveis, hehe.
Não era esse o exemplo que eu tinha em mente, fica pra uma próxima.
Selma é o nome de uma cidadezinha no Alabama, que foi palco em 1965 da famosa Marcha liderada por Martin Luther King, em sua luta pelos direitos iguais para os negros.
O que mais impressiona no filme SELMA, produzido e um pouco protagonizado por Oprah Winfrey, ah, tem Brad Pitt na produção também, e um elenco verdadeiramente estelar, o que mais impressiona é o tempo. Em 1965 os EUA eram um caldeirão de conflitos raciais, algo impensável e inacreditável nos dias de hoje. E foi a apenas algumas décadas atrás! Era muito peculiar que aos negros, cidadãos americanos, eram negados os mais básicos dos direitos, mesmo aqueles que já estavam garantidos por lei. É como se uma superdose de intolerância estivesse circulando nas veias dos "outros" americanos. Muito diferente de xenofobia. Era a aversão ao diferente, e ao que nascia com o estigma da escravidão e minusvalia.
Selma é um filme lento, talvez porque a diretora não quisesse fazer nada explosivo, talvez porque o roteiro tenha entrado no ritmo dos pensamentos de Martin Luther King, um camarada bastante inflamado nos discursos e muito pacífico na ação. A cena em que pela segunda vez tentando atravessar uma ponte em Selma, uma vez que as tropas deram passagem para os manifestantes, Luther King se ajoelha, ora e retrocede, provoca nos companheiros uma reação muito negativa, à qual ele responde: prefiro que me odeiem a que haja mais sangue correndo pelas ruas.
Fez-me lembrar Moisés, que apesar de estar lidando com forças sobrenaturais, é considerado o mais humilde dos proeminentes de Israel. Luther King não pensava em si, não pensava na marcha de hoje, pensava nos direitos consolidados de amanhã.
As cidades com nome de mulher podem ser numericamente inferiores, com suas dores, lutas e mortes, mas são como verdadeiros himalaias: aguentam as tormentas e nos contam suas histórias.
Acho que Selma pode ganhar um dos Oscars a que concorre.